Vou dizer o óbvio…
Este ano de 2020 foi para esquecer em muita coisa. O setor da cultura é um dos mais afetados pela pandemia e no que diz respeito ao cinema e às estreias em sala, as coisas têm estado muito complicadas.
Por Portugal, de março a junho, as salas estiveram fechadas. E mesmo depois de isso, a afluência de público tem sido baixa pelas mais variadas razões.
Cinema Estrangeiro
Em termos internacionais, grande parte das estreias foram adiadas para 2021. Mas mesmo assim, ainda é possível falar de alguns filmes que por cá passaram, quer pelos cinemas, quer em streaming. Duas super-produções acabaram por arriscar e estrearam ainda em 2020.
Uma foi “Tenet”, o mais recente filme de Christopher Nolan, mais uma incursão no cinema fantástico, que acabou por não ter o retorno que muitos pensavam, tendo sido um “flop” no que diz respeito a receitas de bilheteira.
A outra foi “Mulher-Maravilha 1984”, segunda aventura a solo da personagem da DC Comics, que só chegou há poucos dias aos cinemas, mas que apostou numa forma diferente de estrear ao ficar também disponível, pelo menos nos EUA, em streaming.
Também a chegar ao streaming, mais precisamente, à Netflix, está a primeira incursão nas plataformas digitais de David Fincher com um filme ambicioso a partir do argumento escrito pelo seu falecido pai: “Mank”, sobre as histórias e polémicas em torno da criação daquela que é considerada uma obra-prima do cinema mundial, “Citizen Kane”. O papel central foi entregue a Gary Oldman que demonstra, mais uma vez, como se representa.
Mas foi principalmente no início do ano, quando ainda não se esperava que uma pandemia viesse virar as nossas vidas “de pernas para o ar” que podemos ver alguns dos bons filmes estreados em 2020, como “O Farol”, um exercício de homenagem ao cinema impressionista alemão, com mais duas excelentes interpretações de Willem Dafoe e Robert Pattinson. Ou “1917”, de Sam Mendes, uma obra de um plano só, um outro exercício admirável de bom cinema.
De registar ainda o documentário “PJ Harvey: A Dog Called Money”, de Seamus Murphy sobre a viagem que PJ Harvey fez ao Afeganistão, Kosovo e Washington, para a criação do álbum “The Hope Six Demolition Project”.
Cinema Português
Apesar de 2020 ser (atrevo-me a dizê-lo) o pior ano de todos os tempos para o sector da cultura, o cinema português tem brilhado. Não que haja uma produção desenfreada. Houve, sim, uma participação intensa em vários festivais que recompensaram os mais audazes. Quero eu dizer com isto que nem a pandemia impediu o cinema português de se mostrar internacionalmente, tendo arrecadado não só louvores como prémios um pouco por todo o mundo. Mas as dificuldades também se fizeram sentir no sector.
Além de filmes estreados no ano passado como “Vitalina Varela” de Pedro Costa, ou “A Herdade” de Tiago Guedes que continuam trazer prémios para o nosso país, outros, já este ano, têm conseguido o mesmo feito.
Foi o que aconteceu, por exemplo, com “Tio Tomás e a Contabilidade dos Dias”, de Regina Pessoa, uma animação impressionante que tem deixado a crítica, os júris dos certames e o público rendidos. Ou “A Metmorfose dos Pássaros”, de Catarina Vasconcelos, um filme semi-biográfico que também não tem ficado atrás.
Mas há outras obras premiadas como “Mosquito”, de João Nuno Pinto, com uma história passada na Primeira Guerra Mundial, “Patrick”, a estreia na realização de longas-metragens de Gonçalo Waddington, baseado no “Caso Rui Pedro”, “Ordem Moral” de Mário Barroso com Maria de Medeiros, que conta uma história verídica de uma mulher corajosa, e “O Ano da Morte de Ricardo Reis”, um filme muito aguardado de João Botelho a partir do romance de José Saramago.
Na reta final, motivado pelo facto de ter ganho vários prémios, acabou por ser antecipada a estreia este ano de “Listen” que estava inicialmente marcada para 2021. É também a estreia na realização de Ana Rocha de Sousa. Uma aposta ganha, pois é um dos mais vistos do ano, em sala, em Portugal.
Destaque ainda Para “Surdina”, de Rodrigo Areias, com António Durães e Ana Bustorff. Foi uma das primeiras estreias na reabertura das salas de cinema no nosso país, no verão, tendo recentemente ganho três prémios no Festival Internacional de Cinema de Girona, em Espanha.
Séries
As séries continuam a dar cartas e 2020 foi um ano em que se passou muito tempo em casa, por causa da pandemia de Covid-19.
Também houve adiamentos, como as sequelas de “The Witcher” e de “Stranger Things”. Mas não nos podemos queixar, pois não faltaram novidades a invadir os nossos ecrãs caseiros.
Ridley Scott estreou uma nova série, de fantasia e ficção científica, com Amanda Collin e Travis Fimmell (que conhecemos de “Vikings”), estranha e intrigante: “Raised By Wolves”.
Também é de destacar a minissérie “The Comey Rule”, um relato de um encontro conturbado entre o antigo diretor do FBI, James Comey e o ainda presidente dos EUA (por mais uns dias) Donald Trump. Com Jeff Daniels e Brendan Gleeson nos papeis centrais.
A célebre personagem do policial negro e imortalizada na televisão pelo ator Raymond Burr nos anos 1960, o clássico “Perry Mason”, viu a luz do dia numa nova versão, mais dura, agora com Matthew Rhys na pele de um Mason ainda detective privado, antes de se tornar no famoso advogado.
“The Undoing” é outra série que este ano (já na recta final), tem chamado à atenção. É a oportunidade de ver Nicole Kidman e Hugh Grant com interpretações de respeito.
Mas as minhas preferências vão mesmo para outras séries como “The Outsider”, a partir da obra de Stephen King. Uma história muito bem contada, fantástica, e com ótimas interpretações de atores como Ben Mendelsohn, Jason Bateman, Cynthia Erivo ou Paddy Considine. Se não viram, vejam.
Outra é “The Madalorian”, do Universo Star Wars. Uma série para toda a família e que me surpreendeu. Com um Baby Yoda (que afinal… enfim… é melhor não dizer) que é todo “fofinho” e que conquista até os corações mais empedernidos como o da personagem principal, o Mandalorian interpretado por Pedro Pascal.
Mas tenho que dizer que, para mim, é incontornável falar este ano da minissérie “I Know This Much Is True”. Foi a que me encheu mais as medidas. Uma obra hiper-dramática, com uma história que foca as relações pessoais, os segredos familiares e os disturbios emocionais, que fala de depressão e esquizofrenia e que deu um Emmy incontestável de Melhor Ator a Mark Ruffalo.
Termino a destacar a quinta temporada de “Peaky Blinders”. Na minha opinião, séries que chegam até este ponto, a dada altura levam-nos a, pelo menos, pensar em desistir de as ver. Mas no caso de “Peaky Blinders”, isso não acontece. Cada vez que chegamos ao final de uma temporada, choramos por mais.